quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

a mordida
amor
ida
sem volta.

atalho de sumé

como quem escreve na pele
desenha a caverna
com sangue e a dançar.

como um velho profeta
descendo a montanha
nas costas do ar.

como um peixe assustado
com a imensidão
dos clarões do luar.

como um viajante
sem sono descasca
as trevas, a terra, o mar.

como um cometa girando
e engolindo o cosmos
para vomitar.
a propósito das leituras críticas do fogo

improviso como circo ou palhaço
caindo na gargalhada ancestral do diálogo.
os outros, uns poucos, correndo e eu lendo
e o fogo lendo e criticando, o fogo purificando a tarde
de susto e correria, a alegria e a cegueira, chacrinha
e voz baixa da senhorinha, amolar tesoura ou ficar rouco
é pouco diante do mito ou muito louco quando as vozes sussurram o que salta no ouvido, um remédio impreciso,
a loucura, cura da alma doente do consumo, o sumo,
o suco, o poema de fogo.
ao contrário do gabriel garcía márquez

ainda
ainda não
ainda não comi
ainda não comi uma
ainda não comi uma puta
ainda não comi uma puta triste.
a lesma e o raio laser
dos olhos perdidos, o coração
e a choupana da sabedoria, gramática
do macaco distraído com umbigos, preguiçoso
bater do prego numa barra de sabão.

fábula da nebulosa, chuva irrigando
as ferrugens dos arquivos, laranjas, discos.
eu e o planeta
somos uma mente
borbulhando na água
acumulada na cavidade
que os pés dos cavalos
deixam na argila.

eu e o planeta
somos uma manticora
deitada sobre ervas

mastigando os cabelos
dos ventos que entregam
pizzas para formigas famintas.

eu e o planeta
somos plantas, lunetas,
antas e caravanas de corvos,
curvas de montanhas e carvões
colhidos nos estômagos das bactérias.

eu e o planeta
somos a soma dos sopros:
afago, atrito do infinito
com as moscas, ignição.

domingo, 25 de novembro de 2012

sabedoria da rã
taoísta e brotos
de capim entre
as costelas e o
sono sossegado
do pêssego e a
nuca da jabuticaba
onde a abelha
lambe o açúcar
sem se machucar.
homem velho
olhando a geladeira
e a vida do abutre
que circula ao redor
das árvores míticas
que perfuram a terra
com as raízes e o céu
com seus galhos e olhos

homem velho

arrancando sorrisos
da memória banguela
e costurando sobre
as costas do inverno
um terno delicado
com os rastros do sol
ainda grudados na pele

homem velho
cavando as montanhas
enquanto o oceano
cospe suaves sopros
em seu coração de ouro
banhado pelo cheiro
de alecrim selvagem
e afeto lunar.

princípios de manutenção dos estranhamentos

coice de estrela
na caixa dos peitos

carcaça de sonho
na terra úmida

beijo de aurora
na triste pupila


panfleto de fogo
na esquina da torre
de observação

coração de tigre
na vibração dos dentes

divindade de planta
na cavidade dos tímpanos

tripulação de peixes
na loucura dos olhos

boca de leão
na cabeça lúcida
do bancário.

domingo, 11 de novembro de 2012

fique quieto, disse
o orangotango miniatura
que apareceu
no meu ombro esquerdo
há nove dias

corte os cabelos
da alma, ame
a respiração
perto das laranjas

e das uvas

ouça
muitas águas.
o azul permanece azul
apesar das moscas e do tédio
através do espaço

adiante
um velho escocês
com olhos de jaguar
compõe canções lentas
para a próxima migração
das baleias azuis


o azul permanece azul
ao redor da pupila onírica
da ninfeta anarquista

zumbido
das guerras interiores:
tempestade que amanhece
no antebraço, coragem
do grão no ventre da terra
fértil e doce.

o azul permanece azul
água profunda do útero
aquecida e circulando
na medula e nas asas
da libélula.
oração que aprendi com uma tartaruga
 

que o dia seja
um diamante,
um manto coberto
de amor e amoras

que a noite seja
uma cereja,
uma cerveja gerada
pelo cosmos e gelada.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

nasceu e andou
e parou pra coçar
a barriga

observou
as pessoas
e os sapos

sorriu,
agradecido,

por existir
o infinito
e as águas

dormiu
sobre o dorso
do leopardo

sonhou
o umbigo
do elefante

sumiu
na soma
das sombras

e nasceu e andou
e parou pra coçar
a barriga.
ando exposto
à ternura
e às tesouras
(ainda caio em poços).

carrego comigo
garrafas de água
e uma mágoa ambígua.

anfíbio e filósofo:
quase sempre esqueço
o endereço e os fósforos.

domingo, 4 de novembro de 2012

comunicação da tecnologia dos deuses

beijo na alma
e a força eletromagnética
do planeta e moveremos
gigantescos blocos de pedras

energias:
os mapas são muitos cabelos.

crânios de ursos e mágicos
numa câmara
atingida pelo sol
no solstício de inverno

espíritos
numa migração cósmica
através da fenda do cisne.
osso que recobre a pele

os sumérios sumiram
com as pérolas
e a telepatia
de alta velocidade

as canções
da invasão alienígena
e os desenhos do projeto

por um teletransporte
público

a mente sonha
com tartarugas
e fogueiras anciãs

polegares
coçando os olhos
da floresta

biografias das folhas
perdidas nas ventanias.
trouxe
do supermercado
um pouco
do universo
em conserva,
mas esqueceu:

a erva,
um louco
e um verso
alucinado.
pensamentos descalços
num passeio de bicicleta

enquanto no coração
tosse e amor
se revezam.

oração silenciosa
da rosa rugosa:

nenhuma rusga
com o musgo.
o futuro e as formigas
cobrem minha barriga

a noite abre a boca
a boca abre a noite

hora pacífica,
asas, éter:

filme ancestral
no tornozelo.
pouco medo
instalado
na medula

fico à toa
de papo
com a papoula.
mulheres magras, bagres
revoada de tigres
e ogros.

lembrar das sombras,
treinar os ombros.
um cabrito
guarda no estômago
o capim do mito.

um cavalo
come algas e o grito
de águias.

assobio
do tambor

no tímpano.

uma xamã
sobe na árvore lilás
para amamentar
a manhã.
a loucura é um sopro
no ouvido. ovíparos
ao redor da lanterna
e um terno incendiado
azul como um domingo.

hortelã no hotel lunar,
abacaxi e papoulas.

um pomar de acerola,

pulmão cósmico generoso.

grous repartem
lagartas chapadas de haxixe.

a noite é uma formiga
de tocaia, sobre a barriga
dos últimos chimpanzés.
há uma porta
na folha: olha.

a chuva molha
a passagem.
a viagem é
torta.
vidente vagando
com um casaco arcaico

dentes estragados
e bagos de uva

óvulos, violetas
e as asas da coruja

medula, sangue

e a sabedoria da seiva

viagem vagarosa:
as pernas ouvem
o ruído da rosa.
ruminando
a grama escura
do abismo.

coração amargo:
nenhuma ameixa
me deixa sereno.

uma leoa pousou
nos meus ombros

e sumiu.

desordem do dia:
nuvens de ideias
são vespas
numa garrafa vazia.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

um macaco, uma coruja

a morte acontece,
como o dia e a noite.
palavras e dentes
caem no chão.

um pulo, um urso
o dorso de um tigre
um ogro tomando pílulas

num ônibus noturno.

um poema, um ruído
o silêncio do vidro
folhas verdes
no coração.

um macaco, uma coruja
desenhando estrelas
nas gotas da chuva.

um sussurro, um eco
um treco qualquer:
um soluço.
as ervas
me telefonam
das trevas

e desenham
a retina
do breu

antebraços
dos chimpanzés

cobrem a lua

e escondem
um carvão
entre os dentes
de deus.
de volta para o futuro recife

eu tomo um gole de ácido
tenho a gula de asas
ainda ando descalço
apesar das ruínas das casas

milhões de carros

atropelam minha alma
não tenho calma
neste inferno cheio de prédios

porcos e urubus
lotam os elevadores
a cidade arregala os dentes
e cospe em nossos amores

chove merda
nos corações dos pedestres
e a polícia toca fogo
nos bilhetes das passagens extraterrestres

as pernas saem do chão
e pisam no teto
de concreto sobre o mangue
e sua monocultura de torres

estou cego e vejo
as faíscas e lampejos
das caronas com os discos-voadores.

sábado, 22 de setembro de 2012

a pupila do afeto
desconhece teto
salta sobre o muro

o coração
é um carvão
da memória do futuro

o silêncio
é um gato
que enxerga
no escuro.
guarda gravetos
na gaveta

cospe cacos
do coração

sopra sapos
na sombra

avista alma
da avelã.
o que será
de nós
além de nus?
mantra

o que existe
é o êxtase.
doces lampejos
dos delírios

arcanjos alucinados
colhem lírios.
o vento
carrega uma canção
na barriga

as folhas
abrem a boca
do tempo

uma serpente
engole a lua


corações
cavalgam a noite
da floresta

pupilas mastigam
a escuridão.
a mandíbula
de uma estrela
adormecida

o fêmur
de um lêmure
distraído

o ouvido
de uma avenca

vesga

a ruga
de uma vespa
rindo.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

lua cheia
rachou a mente
guardada nos bolsos
da garota de sorte.
garrafa de urânio
e eu leio
um poema de petrônio
num mural

enquanto
alguns gnomos
distribuem gomos
de tangerina.

domingo, 2 de setembro de 2012

cair na cama
com calma:
mergulho
n'alma.

amor num mar de muito



o amor enche a barriga de grilos
(uns nove quilos).

deixa a mente
num aquário de aguardente.
cobre a alma
com folhas de cobre.
morde os olhos e os dedos,
depois cospe alguns medos.
coloca carvão na medula
e amarula no coração.
assobia canções nos ouvidos
sobre mastigar vidros.
guarda um jaguar
no calcanhar.
massageia as pernas e o pescoço
e entrega água
de um poço sem fundo.

o amor fortalece os ossos.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Anti-Tirésias



      Caminhamos sobre um abismo de imagens, entorpecidos pelo volume assombroso de vultos e espectros cotidianos, olhos embaciados pelas vertigens eletrônicas, virtuais; e mentes fustigadas pelas demandas torrenciais das mediações imagéticas entre o mundo objetivo, do espetáculo e a noz da subjetividade. Somos um batalhão de anti-tirésias, videntes sem profecia, olhos abertos para não-ver o mundo, seguindo a corrente sufocante da ditadura do rosto humano - já nem lido, apenas deslizado numa superfície interpretativa, banalíssima. Apartamentos apinhados de tecnologias: câmeras, scanners, binóculos, lupas, etc. E o que vemos? Nem a sujeira no nosso umbigo. “Os animais entraram na imaginação primeiro com mensageiros e promessas”. 

A história de nossa espécie é permeada, costurada com nosso próprio sangue e o sangue das outras espécies, além da seiva e das matérias inorgânicas dispersas e subjugadas sob nosso sonho panóptico e de poder desmedido. Não vemos, de olhos bem abertos, a crueldade diária que se inscreve sobre os ombros da multidão sem-nome (animais e animais humanos). E a parte humana da multidão sem-nome segue comprando comida nos pet shops para gatos e cachorros, percorrendo os corredores dos supermercados para conseguir atum em lata, porcos retalhados em deliciosos pedaços de bacon, camarões congelados, bois e vacas recortados sem a memória do mugido, galinhas empacotadas no plástico onipresente retirado, desdobrado das entranhas da terra sob a forma do líquido negro vital para a sociedade de apetite insaciável. Apesar das tecnologias de “visão além do alcance”, ou justamente por elas, não percebemos a dispersão cruel das presenças animais no percurso de nossas vidas: a “redução do animal, que tem uma história teórica e econômica, é parte do mesmo processo pelo qual os homens têm sido reduzidos a unidades produtivas e consumidoras isoladas”. 

Satisfeitos em nossas baias, percorrendo velozmente as estradas sofisticadas do delírio assassino e asséptico, transferido, lidamos com os animais apenas na medida de nossa fome. Mesmo que os “animais da mente” não possam ser facilmente dispersos, seguimos nossa voragem cheia de dentes, confortavelmente acomodados nos sofás, bebendo leite da cabra nunca vista, comendo carne de lata ou algum sushi. E, depois da refeição, ou ainda durante ela, ficamos nos entretendo com os desenhos do pato Donald, as aventuras da formiga atômica, as desventuras da turma do urso Zé colmeia, etc. 

Eu não vejo a foto do elefante dentro do útero (apesar da insistência da National Geographic). Eu nunca vi um elefante, nem mesmo na prisão/escola/manicômio designada por zoológico. O que eu vejo, envolvido num tom róseo, sanguíneo, é um fantasma, uma lenda, um mito – aparição sobrenatural, de olhos fechados. Observo, mas sedado. “(...) animais são sempre os observados. O fato de que podem nos observar perdeu todo o significado. Eles são os objetos de nosso conhecimento sempre crescente. O que sabemos sobre eles é um índice de nosso poder, e assim é um índice do que nos separa deles. Quanto mais sabemos, mais distantes eles ficam.” 

Vejo um futuro mamute, mera imagem retórica povoando algumas camisas, discursos, nomes de bandas ou qualquer outra bobagem que não possa me ferir. Apontamos nossas câmeras para os animais como se fôssemos documentaristas de zumbis, fascinados pelo dedo que aponta a lua – e sem ver sequer o lado claro da lua. Fotos, filmes, brinquedos de pelúcia, carrossel, mascotes, jogo do bicho: caricaturas sem sangue, sem possibilidade de verdadeiro encontro. “Zoológicos, brinquedos animais realistas e a difusão comercial ampla de imagística animal, tudo isso iniciou quando os animais começaram a ser afastados da vida cotidiana. Poderíamos supor que tais inovações foram compensatórias. Mas na realidade as próprias inovações pertenciam ao mesmo movimento cruel da dispersão dos animais”. 

Como um exímio anti-tirésias, não vi a ausência do elefante, nem recebi uma visão profética de tempos renovados de respiração no mundo natural. O que eu vi, numa fotografia digital, foi um beco, foi um eco, pálido, de uma vida destroçada pelo vírus humano e sua jornada de câmeras, dentes, pólvora e foguetes caralhudos: arsenal de tecnologias de extermínio. Visão opaca debaixo do sol, humanos a sós.

*os trechos entre aspas fazem parte do ensaio "por que olhar os animais?", de John Berger, no livro "Sobre o olhar".

quarta-feira, 21 de março de 2012

nós
nus
nas noites

no interior
dos corpos

no copo
das mentes

na cama
que está
no chão

no ciclo do são joão
no fôlego do sim
e no coração-cabeça.

não esqueça:
a noite e o dia:
juntos na festa, na caverna, no lago e na relva:
no ninho - caminho de palavras e línguas:

- braços e pernas:
- ossos e almas:

inventamos o território
de uma alegria e de um sorriso:

- não cessa.
árvore gigante
onde o pássaro do sonho
pousa e delira

trilha dançante
onde o peixe da visão
anda e respira

floresta e canção
onde o leão
vive e revira:

o tempojunto,
cheio de vida.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

bêbados traduzindo
poemas tibetanos

os sapatos roubados
dos supermercados

o vento é um cavalo:
vinho irrigando
as pupilas.

brenha cósmica,
manuscrito do mandril
no musgo.
há um imenso trabalho
para a boca vegetal da loucura:

comboio de corças incendiadas

deusas cuspindo gafanhotos
sobre os dorsos dos tigres

imigrante chinês
traduzindo poemas anarquistas italianos

bolas de gude
feitas de pequenos sóis

palhaço ancestral
revirando as cinzas da fogueira
de ossos

gnu guardando gravetos
na gaveta do inverno.
poemas e garrafas de vinho:
intuição magnética.
eletricidade remoendo
a nuca e os calcanhares.

caminho
aberto pelo acaso.
corpojunto,
carinho.

respiração e memória.
gargalhada dos ossos, galáxia dos olhos.
energias deliciosas cobrindo pernas,
peitos, umbigos.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

animais
roendo a madeira
e a imaginação

alma verde costurada
nos dentes do tigre

a lua fervendo
a linguagem das águas

crânios de ursos
e colunas de pedras:
passagens, cavalos
para escalar o azul.
chuva de ácido
sobre os cabelos
dos centauros
trotando nos travesseiros

as bochechas
do fogo comendo
insetos e certos
cantos antigos

a pança do tempo:
abrigo rigoroso
do infinito

mosquitos desenhando
sorrisos nas costas
dos crocodilos.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Visão da Gaveta Enferrujada do Reino da Pedra Burocrática

(...) e alguns sabem que não é preciso procurar muito tempo para encontrar, dentro da Gaveta Enferrujada, entre os bonecos dos loucos, dos bêbados e das atrizes, um carimbador patético. Ele facilmente se torna ridículo e se embriaga com qualquer porção efêmera de. Você pode notar tranquilamente que ele sofre da síndrome do pequeno poder. Como um cabo setenta borra-botas, fica mergulhado em sua jornada histérica de autoridade: com seu carimbo, despacha porções extras de amendoins para os bons-moços listados na planilha de Normas Técnicas e Bom Comportamento da Reunião da Comissão Setorial de Planejamento e Distribuição de Comidas com Flavorizantes.

O carimbador patético é um pobre-diabo, hipnotizado pela repetição robótica de seus gestos esvaziados de qualquer sentido, qualquer bom senso. Ele põe em movimento uma farsa deliberada: ao carimbar as fichas dos participantes da reunião contemplados com as porções extras de amendoins, finge para si mesmo que seus gestos são importantes e organizam os desordenamentos do mundo. Aos ajustados, amendoins.

Os bêbados, os loucos, as atrizes não recebem amendoins extras, entregam os amendoins regulares e se divertem com a cena toda: como um bando de galinhas no confinamento, os ajustados bicam os grãos, com um riso de felicidade comprada no supermercado, corredor nove. Para o carimbador patético, e apenas para ele, isto soa como um juízo final, como um julgamento no qual ele é senhor. Mesmo sem ter idéia alguma de como trazer vida e mágica para seu dia estéril, entre amendoins. O carimbador patético nunca viu o amendoim na terra, uma plantação. Apenas repete os gestos para os quais finge ter vocação: confere os pacotes de porções extras, confere os cadastros com os históricos dos participantes. E carimba, carimba, carimba.

Ficou lambendo as solas dos sapatos do poder, considera que alcançou um excelente posto de trabalho, não precisa fazer mais piadas sem graça enquanto enche um copo com água, tem direito às porções extras de amendoins e ainda usa seu carimbo durante toda a jornada de trabalho – mas também fora dela. Afinal, qual a graça de ser um carimbador patético apenas na Gaveta Enferrujada do Reino da Pedra Burocrática? O carimbador não conversa com os loucos e bêbados e não trepa com as atrizes, mas sente-se vivo enquanto toca o carimbo na almofada de tinta e depois desce com força sobre as fichas cadastrais. Os idiotas herdarão os amendoins: o carimbador patético vive para cumprir isto. Os loucos, as atrizes e os bêbados dançam durante dia, tarde e noite, vivos, com uivos. O carimbador patético come amendoins.