Recife, eu tinha pernas miúdas
muito antes dos porres de vinho
nas rodas punk no Antigo
muito antes do trabalho triste
de ligar para delegacias muito antes
de ver a cabeça de pedra de Bandeira
muito antes de atravessar as pontes
de madrugada e voltar para o futuro
Recife era a pequena casa de minha avó
numa travessa ali perto da Aurora
e a vida chegava com suas bagagens do incompreensível
com os garotos que cheiravam cola, com o mendigo
(que se chamava Amigão) quase sempre bêbado
e eu não pensava na morte e me deitava
no colo de epifanias nanicas
olhar por cima do muro um estacionamento
nos ombros do meu tio, receber uma fita k-7 do Pantera
gravada pelo meu primo, reparar no colorido das embalagens dos cigarros
ao ir comprar pão na padaria Aquário, logo ali na esquina
Recife, minha avó mais velhinha e minhas pernas
misturam os caminhos que me trouxeram pra cá
Rua do Sossego, Alegria, Glória, Fundição
Recife, passagem de som e sonho,
tropeção
quarta-feira, 18 de maio de 2016
poema desentranhado de uma fala de Ian Mackaye
estamos aqui conversando
por quase duas horas
e enquanto conversamos
nas dobras do mundo
criaram poemas
e músicas
suficientes
para nos alimentar
pelo resto de nossas vidas
por quase duas horas
e enquanto conversamos
nas dobras do mundo
criaram poemas
e músicas
suficientes
para nos alimentar
pelo resto de nossas vidas
a new beat from a dead heart
foi depois da chuva
quando caminhei fora da
cabeça em direção à vida
e me tornei contemporâneo
das mais velhas árvores
quando caminhei fora da
cabeça em direção à vida
e me tornei contemporâneo
das mais velhas árvores
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